A Nota de Esclarecimento divulgada pela Dinâmica Terminais de Combustíveis (DTC) tenta cumprir um papel clássico quando escândalos começam a ganhar corpo: conter danos, reduzir tensão institucional e antecipar uma linha de defesa. O problema é que, juridicamente, ela esclarece menos do que promete — e, politicamente, abre ainda mais perguntas do que fecha respostas.
A DTC não nega a existência dos dutos. Ao contrário, confirma. Afirma que eles interligam estruturas internas de armazenamento e logística e que fazem parte do sistema operacional do terminal. Essa admissão, por si só, já é relevante: não se trata de boato, erro de interpretação ou estrutura abandonada. Os dutos existem, estão integrados à operação e cumprem uma função ativa.
O ponto sensível começa quando a empresa sustenta que os ativos estão em processo de regularização, com licenças ambientais e adequações regulatórias “em trâmite”. Aqui está o primeiro nó jurídico: regularização em curso não é licença concedida. Se houve operação antes da conclusão do licenciamento ambiental competente — estadual ou federal —, a irregularidade não desaparece pelo simples fato de um processo administrativo ter sido iniciado depois.
A nota tenta afastar essa leitura ao afirmar que as medidas foram adotadas antes mesmo de ações fiscalizatórias. É uma estratégia conhecida no direito administrativo e ambiental: invocar boa-fé e espontaneidade para atenuar sanções futuras. Mas boa-fé não substitui licença, e espontaneidade não apaga o passado operacional de estruturas potencialmente sensíveis.
Outro ponto que chama atenção é a ênfase nas autorizações municipais. A DTC afirma que possui licenças locais vigentes e que atua de forma colaborativa com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Semad). O que não se diz — e isso é decisivo — é se o município tinha competência plena para autorizar um sistema de dutos de combustíveis, com potencial impacto regional, risco ambiental elevado e possível interface com a cadeia nacional de abastecimento.
Licenças municipais não suprem, automaticamente, exigências estaduais ou federais quando o empreendimento ultrapassa o interesse estritamente local. Esse detalhe não é técnico: é estrutural. E quando há dúvida de competência, há também risco de nulidade dos atos administrativos e responsabilização de agentes públicos.
Mas o silêncio mais eloquente da nota está em outro campo. A DTC não informa quando os dutos foram construídos, há quanto tempo operam, qual a extensão exata, a capacidade de bombeamento, o tipo e o volume de combustível transportado. Não esclarece a origem nem o destino do produto. E, de forma sintomática, não menciona a ANP, nem qualquer autorização federal específica para movimentação de combustíveis.
Também não há uma única linha sobre Transpetro, distribuidoras ou eventuais conexões com a infraestrutura nacional. Em investigações desse tipo, o que não é dito costuma ser tão revelador quanto o que é afirmado. E esse silêncio mantém aberta uma hipótese grave: a de que os dutos possam integrar uma engrenagem maior, ainda não totalmente exposta.
Ao declarar “total colaboração com as autoridades”, a empresa tenta se posicionar como parte interessada na solução. Mas, ao mesmo tempo, essa colaboração pressupõe que há algo a ser esclarecido — e não pouco. Quando documentos, projetos técnicos e informações precisam ser apresentados a posteriori, é porque o caso não está encerrado. Está apenas começando.
Do ponto de vista jurídico e institucional, a nota da DTC cumpre um papel defensivo legítimo, mas insuficiente. Ela organiza o discurso da empresa, tenta reduzir riscos imediatos e prepara o terreno para negociações administrativas futuras. O que ela não faz — e talvez não pudesse fazer — é responder às perguntas centrais que hoje interessam à sociedade, aos órgãos de controle e, sobretudo, às autoridades investigativas.
Este caso não se resume à existência de dutos. Ele envolve licenciamento ambiental, competência administrativa, cadeia de combustíveis, eventual omissão estatal e a possibilidade concreta de que estruturas sensíveis tenham operado à margem do controle adequado por tempo significativo.
A nota não encerra o assunto. Ela inaugura uma nova fase. Uma fase em que não basta dizer que está “em trâmite”, “em diálogo” ou “em regularização”. O interesse público exige saber desde quando, como, com que autorização e com quais consequências esses dutos operaram.
Quando a resposta oficial é genérica demais, a investigação precisa ser precisa. E, neste caso, tudo indica que o subsolo ainda guarda mais respostas do que a superfície quer admitir.
Veja a íntegra da nota
Nota de Esclarecimento – Dinâmica Terminais de Combustíveis (DTC)
A Dinâmica Terminais de Combustíveis (DTC) esclarece que os dutos interligam as estruturas de armazenamento e logística do empreendimento.
A empresa destaca que todas as medidas administrativas e técnicas já foram tomadas, antes mesmo da ação para a plena regularização desses ativos, com os processos de licenciamento ambiental e adequação regulatória em trâmite junto aos órgãos competentes, inclusive em âmbito estadual.
As operações da DTC são realizadas de forma controlada, com monitoramento técnico permanente, observando padrões de segurança operacional e ambiental reconhecidos pelo setor.
No que se refere às licenças, a DTC esclarece que possui autorizações municipais vigentes e que atua de forma colaborativa com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) e demais órgãos envolvidos para atender a todas as exigências adicionais eventualmente apontadas no curso da fiscalização.
A DTC está prestando total colaboração às autoridades, disponibilizando documentos, projetos técnicos e informações necessárias.

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