Nos últimos dias, um vídeo brutal começou a viralizar no WhatsApp. Ele mostrava uma jovem sendo executada em uma cova rasa com dois tiros. Um dos motivos que fez o vídeo (que obviamente não será divulgado aqui) se espalhar na internet foi uma “lição de moral” que o acompanha.
Junto à filmagem, imagens da jovem e um áudio começaram a circular. No áudio, a moça que morreu teria relatado que só namora pessoas com problemas na justiça. Escute o áudio (preste atenção no sotaque, ele será decisivo no desmentido), leia a transcrição dele e um texto que o acompanha (em algumas versões):
Transcrição: É que pra me pegar tem que ter, no mínimo, três passagens. E se quiser namorar comigo, namorar sério, tem que ter, pelo menos, um homicídio, um 33 de tráfico. Entendeu tem que andar todo dia de Billy mesmo, tem que falar só na vinheta. Entendeu? Minha molequinha, essas coisas Se vim conversar comigo normal ou com outras conversas, não me pega não. Você sabe. Não dá, eu não consigo amiga. Não consigo namorar se ele não falar que vai raspar a minha cabeça, se ele não ameaçar colocar fogo em mim, se ele não querer me dar umas facadas quando tiver com ciúme. Pra mim não dá.
Versão 1: olha o que acontece com marmita de bandido que significa (mulher que so namora vagabundo ). Versão 2: Tá aí pra quem gosta de namorar com Bandido Sou contra qualquer forma de violência, compartilhei este vídeo para alertar as jovens.. Que Deus tenha misericórdia da família que agora chora a sua morte. Versão 3: Infelizmente vim alerta as meninas que gosta de bandidos. O fim é esse um dia tudo chega ao seu fim, Deus console a família
Mulher assassinada em cova gravou áudio dizendo que só namora bandido?
Como dito antes, as imagens da morte da jovem, as fotos dela e o áudio se espalharam muito na internet. Mas será mesmo que a pessoa que morreu gravou um áudio dizendo que só “pega” quem tem três passagens pela polícia e só namora bandido que já cometeu homicídio? A resposta é não. Para você entender tudo, vamos aos fatos.
Para desvendar a (não) ligação entre o assassinato e o áudio, tivemos que buscar mais detalhes do caso. Infelizmente, a morte da jovem é real. Trata-se de Paola Avaly Corrêa, de 18 anos. Moradora de Porto Alegre, ela desapareceu em 13 de maio de 2018 e foi identificada pela família no vídeo. O corpo dela foi encontrado na capital gaúcha no dia 18 de maio.
Ainda há investigações em curso no caso, mas se suspeita que o homicídio foi fruto de desavenças dela com o ex-marido (de fato, um presidiário) e com uma mulher. Vamos deixar as investigações do assassinato para a polícia e o julgamento de o que ela fez ou não fez na vida para o “tribunal da internet” e vamos focar no ponto. O áudio que está “patrocinando” o vídeo não é dela.
O primeiro ponto que mostra que Paola não é a autora do áudio está nas próprias fontes da informação. Apesar de a imprensa ter noticiado a morte dela, apenas sites que publicam fake news e usuários do WhatsApp e Facebook atribuíram o áudio a ela. Detalhe: o áudio começou a circular alguns dias após a publicação do vídeo (e como dito, ajudou ele a se espalhar). Com isso, já dá para desconfiar da história.
A verdade veio à tona com uma análise mais aprofundada do conteúdo. Note que Paola era moradora de Porto Alegre. Quem conhece o Sul sabe que o sotaque dos porto-alegrenses é muito característico. De maneira alguma, Paola falaria “minha molequinha” (falaria minha guriazinha), “você sabe” (falaria tu sabe) e tampouco teria o sotaque (note no “r” do “conversar” e “normal”). O sotaque se assemelha ao de estados do Sudeste ou Centro-Oeste. Nunca, mas nunca do Rio Grande do Sul.
A prova final de que a jovem assassinada não falaria daquele jeito está em mensagens escritas em redes sociais. Além das mensagens comprometerem algumas pessoas (e ter centenas de comentários imbecis por parte de quem não respeita uma pessoa que morreu), elas mostram que o linguajar dela não se assemelha ao da gravação.
Note que há gírias, mas são totalmente diferentes (você só vai entender se morou no Rio Grande do Sul durante a adolescência como esse editor que vos fala) como “te fraga”, “ratia”, “piá de m…” e, como falamos antes, guria. Pode ter certeza de que se o áudio fosse dela, seria muito diferente.
Resumindo: o desfecho da história da jovem Paola Avaly Corrêa é triste. O vídeo é verdadeiro e, de fato, ela tinha um relacionamento com um presidiário. Porém, o áudio que circula no nome dela é falso. Estão tentando criar uma “lição de moral” na história com um conteúdo que não foi gravado por ela
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