O documento acusa o prefeito de Nerópolis de manter-se como sócio-administrador de empresa privada, em flagrante violação ao art. 68 da Lei Orgânica Municipal, que proíbe de forma expressa que o chefe do Executivo exerça função de administração em qualquer empresa privada, sob pena de perda automática do mandato .
Essa constatação coincide com as informações de bastidor que ligam o prefeito à administração do Hospital Sagrado Coração de Jesus, instituição que recebe verbas públicas municipais e, segundo denúncia ao MP, pertenceria de fato ao próprio prefeito, ainda que formalmente figure como entidade “filantrópica”.
2. A sobreposição entre o caso do hospital e a denúncia política
Os dois episódios — a intervenção judicial no hospital e a denúncia partidária no MP — convergem para um mesmo núcleo de ilegalidade:
a confusão entre o público e o privado, na qual o prefeito seria, ao mesmo tempo, ordenador de despesas e beneficiário de recursos públicos.
O TJ-GO, ao determinar a intervenção, já havia apontado indícios de uso indevido de verbas e confusão patrimonial.
Agora, a denúncia política formaliza a suspeita de que o próprio chefe do Executivo municipal era o verdadeiro controlador da entidade, que continuava a receber repasses diretos da prefeitura.
Trata-se, portanto, de um caso clássico de autocontratação ilícita e conflito de interesses absolutos, proibido pela Constituição e pela Lei de Improbidade Administrativa (art. 11, incisos I e XI, da Lei 8.429/1992).
3. Nepotismo estrutural: a prefeitura transformada em patrimônio familiar
O documento do Partido DC também descreve um cenário de aparelhamento total da máquina pública, com parentes diretos do prefeito ocupando cargos estratégicos:
- Filho 1: Procurador-Geral do Município;
- Filho 2: Secretário de Planejamento e Gestão;
- Nora: Secretária de Assistência Social;
- Primeira-dama: influência direta nas decisões administrativas e em instituições sociais.
Esse tipo de estrutura familiar dentro do poder público é definido como nepotismo estrutural, um fenômeno que não depende de nomeações diretas ilegais, mas da concentração sistêmica de poder e influência em torno de uma mesma família.
É o que o documento chama de “projeto de aparelhamento do Estado”.
4. O papel do Ministério Público e a escalada das investigações
A denúncia pede que o Ministério Público:
- Instaure procedimento investigatório sobre a ocupação ilegal do cargo;
- Proponha ação civil pública por improbidade administrativa;
- Proponha ação de perda de mandato;
- Encaminhe o caso ao MP Eleitoral, por possível abuso de poder político e econômico;
- Oficie a Câmara de Vereadores e o TCM-GO, para que tomem providências institucionais.
Com a intervenção judicial já decretada no hospital, essas apurações ganham base probatória concreta — pois a auditoria ordenada pelo TJ-GO pode confirmar o fluxo financeiro entre a prefeitura e o hospital controlado pelo prefeito.
5. Impacto político e jurídico: um barril de pólvora prestes a explodir
Nerópolis está, neste momento, diante de um escândalo de múltiplas camadas:
- Um prefeito sob suspeita de administrar um hospital beneficiário de repasses públicos;
- Parentes diretos ocupando cargos-chave no governo;
- Desvios de finalidade em entidade filantrópica;
- E uma intervenção judicial que já reconheceu irregularidades contábeis e patrimoniais.
A soma desses elementos configura violação sistêmica à Constituição, à Lei Orgânica Municipal e à Lei de Improbidade, podendo resultar em:
- Perda do mandato;
- Inelegibilidade;
- Ação penal por peculato e lavagem de dinheiro.
6. Opinião
O que acontece em Nerópolis é a fotografia de um sistema político que transformou a filantropia em negócio e o cargo público em escudo.
O prefeito, segundo os indícios, não apenas controlava a prefeitura, mas também o destino do dinheiro da saúde.
É como se a cidade tivesse um único CNPJ — o dele.
Quando o gestor é, ao mesmo tempo, o fiscal e o beneficiário, não há mais gestão pública: há um feudo político.
O Ministério Público tem agora a responsabilidade histórica de romper esse ciclo de confusão patrimonial e moral que tomou conta da administração municipal.
O Hospital Sagrado Coração de Jesus, que deveria curar, revela uma doença institucional muito mais profunda: o uso da saúde pública como ferramenta de poder.


Nenhum comentário:
Postar um comentário