O Contrato de R$ 138 Milhões Que Engoliu a Frota de Alagoas: Como a PRIME Assumiu o Controle Total do Combustível, da Manutenção e do Cofre Público
Há contratos públicos que chamam atenção pelo valor.
Há outros que chamam atenção pela ousadia.
E existe o Contrato AMGESP nº 052/2022, firmado pelo Governo de Alagoas com a PRIME Consultoria e Assessoria Empresarial Ltda, que não só chama atenção — ele grita.
O Estado entregou à PRIME todo o gerenciamento de frota, desde o combustível até a manutenção, num pacote gigantesco de R$ 138.754.001,68 por cinco anos. Um contrato tão amplo, tão profundo e tão confortável para a empresa que se tornou, na prática, um monopólio operacional da frota estadual.
Nada se move, nada abastece, nada é consertado sem passar pela mesma porta: a da PRIME.
E isso não é opinião — está nos documentos.
O Valor que Não Cabe no Tanque: R$ 138,7 Milhões
O Extrato do contrato publicado no Diário Oficial de 10/11/2022 expõe o tamanho da operação:
• 7.101.899 litros de gasolina
• 8.068.054 litros de diesel
• 532.020 litros de etanol
• R$ 38.679.784,00 em manutenção
Com um detalhe que merece ser repetido:
R$ 38,6 milhões em manutenção — sem tabela de preços unitários, sem detalhamento de peças, sem transparência sobre quantos veículos precisarão dos serviços. Tudo agrupado num único pacote, como uma caixa-preta cara e indevassável.
Os combustíveis receberam um “desconto” padronizado de 2,5%. Um desconto simbólico, um gesto burocrático, incapaz de esconder o volume brutal movimentado.
A Lavanderia da Frota: o Item de Manutenção Que Abre a Porta do Infinito
O contrato define que a PRIME executará:
• manutenção preventiva,
• manutenção corretiva,
• fornecimento de peças,
• lavagem,
• reboque,
• guincho.
Tudo sob o mesmo guarda-chuva — e sem lista de preços.
Na prática, o Estado autorizou a PRIME a dizer quanto custa o próprio serviço ao longo dos cinco anos.
Com isso, criou o terreno ideal para:
• superfaturamento invisível,
• substituição de peças nunca utilizadas,
• serviços fictícios,
• notas genéricas,
• manipulação de oficinas credenciadas,
• e despesas que se multiplicam sem necessidade.
O modelo é conhecido no Brasil inteiro. O cartel da gestão de frotas prospera justamente quando:
1. controla o combustível,
2. controla a manutenção,
3. controla o sistema que registra tudo isso.
Quando uma única empresa controla as três pontas, a fiscalização perde o braço.
E o Estado perde dinheiro.
O Consumo Impossível: O Estado de Alagoas Virou Uma Frota Interestadual?
Os números são tão altos que desafiam a realidade.
Exemplo:
A Polícia Militar de Alagoas aparece com estimativa de 3.850.000 litros de gasolina e 3.000.000 litros de diesel.
Somando todos os órgãos — PM, Civil, DER, ADEAL, EMATER, IMA, SEDUC e dezenas de secretarias — a conta final supera 15,7 milhões de litros.
Para se ter dimensão:
Esse volume abasteceria uma frota interestadual de milhares de veículos rodando sem parar.
A pergunta é óbvia:
a frota real de Alagoas justifica esse consumo?
Sem auditoria técnica séria, a resposta tende ao silêncio — e o silêncio, nesse caso, é caro.
O Edital Que Fecha Portas e Abre Caminhos
O Pregão Eletrônico nº 10.095/2022 adotou o formato preferido das empresas que atuam nesse setor:
Menor preço global.
Ou seja:
• a empresa dá desconto onde não perde,
• recupera tudo (e mais um pouco) onde o Estado não consegue fiscalizar.
O edital ainda exige:
• rede ampla credenciada,
• plataforma tecnológica própria,
• capacidade operacional comprovada em grande escala.
Isso reduz drasticamente o número de concorrentes reais.
E quando o jogo começa com poucos jogadores, o vencedor costuma ser sempre o mesmo.
A PRIME não entrou para competir.
Entrou para levar.
O Estado Entrega a Chave e a PRIME Fecha o Cadeado
O contrato é de cinco anos, prorrogável.
Cinco anos em que:
• a PRIME controla o abastecimento,
• controla a manutenção,
• controla a logística,
• controla os relatórios,
• controla o sistema,
• controla os dados,
• controla a porta de entrada e de saída de cada veículo.
O governo, não.
O governo apenas paga.
A Pergunta Que Ninguém Fez — e Que Agora Precisa Ser Respondida
Quem, dentro do Governo de Alagoas, olhou para esse contrato e disse: “Está tudo certo”?
O papel aceita qualquer coisa.
O tanque não.
O orçamento público, menos ainda.
Com base nos documentos oficiais, o que se vê não é um contrato —
é uma entrega total, um cheque em branco, um monopólio com assinatura do Estado.
E é exatamente nesses espaços de comodidade que os cartéis prosperam.
A PRIME não entrou em Alagoas para prestar serviço.
Entrou para comandar.
E, quando uma empresa com esse histórico assume tamanho controle, a pergunta deixa de ser se haverá irregularidade —
e passa a ser quando ela será descoberta.

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