Vítima de um crime cometido aleatoriamente para “estrear” uma arma recém-adquirida. O alvo poderia ser qualquer pessoa que na tarde da última terça-feira (5/11) circulasse nas proximidades do Lago das Rosas, em Goiânia, com algum bem material que chamasse a atenção dos criminosos, que para comemorar o “sucesso” da ação, foram para um motel usar drogas, consumir bebida alcóolica e participar de uma orgia.
Foi esse o enredo apresentado pelo titular da Delegacia de Investigações de Homicídios (DIH), Murilo Polati, para a morte do policial civil da Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos Automotores (DERFRVA), Cláudio Gonçalves Dias, conhecido como Carral, de 44 anos, morto horas depois de ser atingido a queima-roupa por um tiro na nuca e um no braço na porta do Hospital do Rim, onde estava internada sua esposa.
As informações repassadas à imprensa na manhã desta sexta-feira (8) têm por base depoimento de Jefferson Diego Gaspar de Melo (foto à esquerda), de 25 anos, conhecido como Dieguinho. O rapaz se entregou na tarde desta quinta-feira (7) na sede do Ministério Público de Goiás (MPGO) e foi levado à noite para a Casa de Prisão Provisória (CPP).
Sempre com o cuidado de não repassar informações que viessem a prejudicar as apurações, uma vez que as suspeitas recaem sobre mais duas pessoas e até sobre uma quadrilha especializada em roubo a transeuntes, Murilo Polati acentuou que a principal suspeita para a motivação do crime é que tenha sido um latrocínio –– roubo seguido de morte ––, mas que as outras hipóteses não foram totalmente descartadas, pois a vítima era atuante e chegou a participar de operações que resultaram na prisão de bandidos de alta periculosidade, caso das operações Guilhotina e Cadeia do Crime. O delegado adiantou que novas prisões devem ocorrer dentro das próximas horas.
Jefferson Diego Gaspar não estava presente na coletiva de imprensa. O delegado disponibilizou somente fotos exibidas em uma televisão. O cuidado se deve ao fato de ele supostamente estar sendo ameaçado de morte pelos comparsas, conforme esclareceu o delegado. Quanto a uma retaliação advinda de policiais civis, o delegado descarta que os policiais o matariam.
O suspeito não possui passagens, somente um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) fora registrado em seu nome até a ocasião do assassinato do policial tido como exemplar e que deixa mulher e quatro filhos.
Ele está preso preventivamente e o mandado de prisão expedido pela Justiça foi cumprido na ocasião de sua entrega. Jefferson Diego, que é natural de Senador Canedo, confessou em depoimento alguns delitos, entre eles o de que foi ele quem disparou contra o policial.
O caso não se enquadra na famosa “saidinha de banco”, pois não se deu após o policial sacar dinheiro na lotérica da região, mas ao sair do Hospital do Rim.
Demais envolvidos
“Outras duas pessoas foram identificas, mas terão suas identidades mantidas sob sigilo para que as investigações não sejam prejudicadas. Não posso passar informações se são maiores, menores, mas posso afirmar que já foram identificadas, principalmente o parceiro do Diego [Jefferson Diego Gaspar], que está identificado e já foi até representado pela prisão dele”, explicou o delegado.
Esse indivíduo, segundo Murilo Polati, pilotava a moto da qual Jefferson Diego desceu para cometer o assalto –– segundo sua versão, eles passavam em frente ao Hospital do Rim quando viram Cláudio Gonçalves descendo as escadas contando dinheiro e decidiram abordá-lo. Uma terceira pessoa também está envolvida indiretamente no crime e acompanhava de longe a ação dos comparsas.
O piloto da motocicleta é foragido da Justiça por um crime anterior ao que vitimou Cláudio Gonçalves.
A menor e a comemoração
Indagado pelo Jornal Opção Online em qual situação se encaixaria a participação da adolescente, Murilo Polati esclareceu que ela não é tratada, ainda, como suspeita, mas sim testemunha, e está sendo mantida sob proteção. A menor teria envolvimento com o mundo do crime, é usuária de drogas e, inclusive, teria tido um namorado ou marido assassinado por conta de crimes. A jovem, que não teve a idade divulgada, é prima de Jefferson Diego.
“Ela foi uma testemunha-chave para a Delegacia de Homicídios, inclusive também se encontra sobre proteção do Grupo de Proteção a Testemunhas. Ela apontou de forma veemente a participação dos autores, evidentemente, excluindo alguma situação que desabonasse a sua própria conduta”, informou o delegado, elencando que, “não contentes” com o assassinato do policial, horas depois os autores se reuniram com cerca de outras sete pessoas, entre elas a menor. O grupo foi para um motel “cheirar cocaína, fazer uso de outras drogas, praticara uma grande orgia de sexo” para comemorar o crime.
Cena do crime segundo depoimento do suspeito
Murilo Polati:
Jefferson Diego disse que eles saíram de forma aleatória para cometer crimes e ao passar nas proximidades do Hospital do Rim acabaram abordando antes, segundo um dos autores, uma mulher, quando subtraíram uma corrente de ouro, o que foi feito pelo Jefferson Diego mesmo. No momento em que voltavam para a motocicleta, um deles disse ‘olha o cara contando dinheiro, olha a pacoteira’. Supostamente isso coaduna com a versão, porque o Carral estava com uma quantidade de dinheiro, mas quero não acreditar que ele, um policial com quase 20 anos de experiência, não sairia contando dinheiro em via pública, mas essa foi a alegação deles. Então eles direcionaram a moto, fizeram o contorno, e aí desceram da moto e abordaram o policial.
Jornal Opção Online: Cláudio Gonçalves reagiu delegado?
Segundo o Diego Jefferson ele [Cláudio Gonçalves] esboçou uma reação, aí [o depoimento] ficou muito contraditório, por conta da posição do tiro. No depoimento ele acabou dizendo que o Carral tinha efetuado dois disparos, mas nós conversamos com ele e demonstramos que essa situação não era possível, até porque não havia estojo de munição e a pistola usada pela polícia deixa os estojos [quando dispara], então ele começou a falar a verdade. Falou assim: “Na verdade não vi a arma, ele colocou a mão no bolso”; segundo ele disse, e então para se defender acabou efetuando o disparo que acabou por atingir o Carral na cabeça.
Só que ele não explica de forma correta como foi essa sequência, porque o Carral sofreu um disparo na cabeça, na nuca, a curta distância, e um disparo no braço. Então ele [Jefferson Diego] não chega a explicar como que foi exatamente, disse só que foi muito rápido. A arma utilizada seria um “revolverzinho”, revólver calibre 38.
Retrato falado não é de nenhum suspeito
O titular da DIH fez muitas críticas às informações desencontradas sobre o caso que foram divulgados na imprensa goiana, tendo ressaltado que embora tenha atrapalhado em um certo momento, em outro tais informações acabaram por ajudar no sentido de despistar os suspeitos, já que em alguns casos não tinham qualquer relação com a investigação em andamento.
Dentre as incoerências fruto dessas informações incompletas está a do retrato falado que circula na internet desde a noite do crime. Murilo Polati explicou que o indivíduo retratado não participou do crime que resultou na morte do policial, mas que esse indivíduo teria cedido a moto para os praticantes.
“O retrato falado que foi divulgado não é de uma pessoa diretamente ligada ao crime, mas sim de uma pessoa que poderia ter cometido um assalto cuja moto utilizada no crime teria sido repassada por ele. Então, o retrato é de uma pessoa indiretamente vinculada ao crime, mas totalmente fora da cogitação que fosse um dos autores da morte do Carral”, detalhou. A moto em questão não foi localizada.
Indignação
Ao final da entrevista Murilo Polati demonstrou enorme descontentamento com a situação de os supostos autores serem mantidos sob proteção policial enquanto a família da vítima sequer é amparada pelo Estado com qualquer apoio psicológico, por exemplo. Ontem, no enterro do policial Cláudio Gonçalves, a pasta de Segurança Pública não enviou representantes.
“Nós da Polícia Civil vemos com preocupação esse descaso, e principalmente, por uma pessoa com essa violência, tirou um pai de família, um policial exemplar, estar protegido hoje pelo Grupo de Proteção a Testemunhas, grupo este que não sei se se fez presente na casa da vítima, se está dando a atenção devida, tratamento psicológico ou qualquer tipo de ajuda.
E nós temos a certeza que esses outros autores terão essa proteção, mas ainda estão vivos, e o Carral, infelizmente, não tem retorno”.
Murilo Polati ponderou que a prisão dos suspeitos é a função da Polícia Civil, e que espera que se confirmada a participação, eles sejam de fato punidos, ou seja, respondam presos pelo tempo necessário. “Nós sabemos que daqui a alguns meses, um [xingamento] desses estará nas ruas de novo.”
Fonte: Jornal Opção