quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Facebook - Será Que Essa Doença Tem Cura?

Eu aprendi tanta coisa bacana quando li este artigo de Stephen Marche para o The Atlantic, que me sentiria um criminoso se não compartilhasse algo por aqui.

Algumas coisas a gente já sabe e não tem muito o que discutir: o Facebook está crescendo, as pessoas estão passando mais tempo nele e novos usuários estão entrando para a rede. São mais de 850 milhões de pessoas cadastradas em todo o mundo, e o valor estimado da empresa já beira os 100 bilhões de dólares – o que a torna mais valiosa do que todo o mercado global de café.

Do que todo o mercado global de café.

É no Facebook que as pessoas se encontram e se relacionam, quase sempre com mais frequência do que se encontram e relacionam no mundo físico.

Teoricamente, com o advento do Facebook o número de pessoas solitárias no mundo deveria estar diminuindo, certo?
Mas não é o que mostram as pesquisas. Apesar de cada vez mais conectados, estamos também nos tornando cada vez mais solitários.

Quer ver alguns números?
Em 1950, 10% das residências americanas continham somente 1 pessoa. Em 2010, o número de pessoas que moram sozinhas já representava 27% do total.
Em 1985, 10% dos americanos afirmavam não ter ninguém com quem discutir assuntos importantes. Em 2004, 25% não tinham ninguém para conversar.
Uma pesquisa de 2010 da AARP descobriu que 35% dos adultos acima de 45 anos eram cronicamente solitários; uma década antes esse índice era de 20%.
Usuários do Facebook apresentam níveis mais altos de comportamento narcisista, exibicionista ou de liderança do que os não-usuários de Facebook.

E isso se reflete em doenças mentais e físicas; algo que os médicos já estão chamando de “epidemia da solidão“.

Se você se sente solitário, tem mais chances de desenvolver problemas de demência ou déficit cognitivo, mais chances de ser obeso, mais chances de ter inflamações, mais chances de ter problemas de memória, de dormir mal e de ter depressão – diz o artigo.
“Nós nunca estivemos tão desconectados um do outro. Vivemos em uma época de uma contradição acelerada: quanto mais conectados estamos, mais solitários nos sentimos. Prometemos-nos uma vila global; em contrapartida, moramos em um subúrbio solitário vasto de informação.”


Leia mais depois do jump.


Solitário não significa infeliz, no entanto.

Breves momentos de solidão podem ser incríveis. E festas muito cheias podem ser angustiantes.

Além disso, “sentir solidão” e “estar sozinho” não são a mesma coisa. Mas os números mostram que as duas estão crescendo.

Vou tentar conectar alguns pontos: em dezembro de 2011 escrevi um post aqui no UoD chamado “Sozinhos Juntos“.

A expressão “Sozinhos Juntos” é a tradução para o português do título do livro Alone Together – Why We Expect More From Technology And Less From Each Other, escrito por Sherry Turkle há alguns anos. Turkle é psicóloga clínica e professora de estudos sociais no MIT (Massachusetts Institute of Technology), e escreveu o livro para registrar parte de seus quinze anos de estudos sobre os efeitos psicológicos da internet sobre as pessoas.


No livro ela conta sobre como as redes sociais e a comunicação textual estão transformando a forma como as pessoas interagem entre si:

“Quando você fala ao telefone, você não pensa tanto quanto pensa ao enviar mensagens de texto. No telefone, muitas coisas podem ser reveladas.” – diz um dos entrevistados pela professora.

Quando deixamos de falar ao telefone e passamos a nos comunicar por SMS, chat e Facebook, temos mais tempo para pensar no que está sendo dito. Quantas vezes você, leitor, já não escreveu um comentário no Facebook e apagou – ou então modificou o que tinha sido escrito?

Segundo a autora, a geração instant messenger vem perdendo parte das habilidades exigidas pela conversação face-a-face. Faz sentido. Cada vez que substituímos uma conversa verbalizada por uma conversa em texto, perdemos a habilidade do raciocínio rápido exigido para administrar a conversa.
Segundo Robert Putnam, autor do livro Bowling Alone (“Jogando Boliche Sozinho”), há uma série de fatores que ajudam a explicar essa epidemia da solidão: a expansão das metrópoles, a cultura da televisão, a auto-absorção dos Baby Boomers, a desintegração da composição “tradicional” das famílias (pai, mãe, filho, filha, cachorro, papagaio).

Conectando mais alguns pontos: agora voltemos ao Facebook.

Um outro estudo mostra que os usuários de Facebook que têm um comportamento mais introvertido preferem mandar recados no mural dos amigos, enquanto as pessoas mais extrovertidas preferem usar o chat, além do mural. E que receber um comentário por escrito em um post que você fez no Facebook ajuda a aliviar o seu sentimento de solidão com muito mais eficácia do que quando você recebe um “like” apenas.

“Isso quer dizer que se você quer aliviar o sentimento de solidão de um amigo, você deve comentar naquela foto onde o filho dessa pessoa aparece todo lambuzado com aquele bolo do Harry Potter, e também dizer por escrito o quão interessante ficou aquela foto em preto e branco que seu amigo tirou da linha do horizonte, e tambémcomentar o quão descolada essa pessoa é por estar no show em que ela acabou de dizer que está. É isso que ela quer ouvir.” – diz o autor do estudo.


É esse tipo de elogio que a gente quer ouvir quando posta alguma coisa lá.

Em 2004, li um livro chamado “Vida, o filme”, de Neal Gabler, que falava justamente sobre esse processo de espetacularização da vida. Com o avanço da indústria do entretenimento no século XX, a vida das pessoas acabou sendo inundada pela mesma lógica narrativa presente no cinema e na televisão – a ponto das histórias contadas pelas pessoas se apropriarem dessas mesmas técnicas ficcionais.

No mesmo ano em que li esse livro, o Orkut se tornou o site mais acessado do Brasil.

Voltando ao artigo do The Atlantic: há um trecho que diz que não é a internet que faz as pessoas solitárias, mas sim as pessoas solitárias que são mais atraídas pela internet. Por outro lado, quanto mais você lê sobre a vida dos seus amigos e sobre o quanto-eles-são–felizes-em-fotos-felizes-e-momentos-felizes, mais triste você fica.

“Se duas mulheres conversam com seus amigos a mesma quantidade de tempo, mas uma delas passa mais tempo lendo sobre seus amigos também no Facebook, aquela que lê tem uma tendência a se tornar levemente mais depressiva.”

Por outro lado, muita gente afirma que o Facebook é uma ferramenta incrível – e que seus benefícios ou malefícios só dependem da forma que as pessoas o usam. John Cacioppo, diretor do Centro de Neurociência Cognitiva e Social da Universidade de Chicago, diz:


“Usar o Facebook é como usar um carro. Você pode usá-lo para buscar seus amigos e ir a lugares com eles. Ou você pode dirigir o carro sozinho.”

Quando vejo alguma pessoa reclamando da falta de privacidade do Facebook, a única frase que passa na minha cabeça é “mas você está lá porque quer”. Claro, seria imprudente dizer isso em voz alta.

A gente usa a internet pra ficar mais conectado com nossos amigos, e depois tem que usar a mesma terrível-e-nociva-internet para definir filtros de privacidade que nos protejam deles.

Talvez seja só mais uma escravidão, como aquela gerada pela moda ou pela estética-da-mulher-magra. Por “escravidão”, me refiro àquele sentimento de “eu preciso fazer parte desse grupo, por mais que o fato de eu fazer parte dele me traga consequências terríveis”.

Já ia me esquecendo.

A resposta de Stephen Marche para a pergunta-título deste post: não é o Facebook que está nos tornando mais solitários. Nós é que estamos

Fabrício Teixeira - Designer

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